sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Feliz ano bobo

Mais uma vez, começar o ano com Alice Ruiz. Adoro este poeminha, que passa pela minha cabeça todo primeiro de janeiro

Dia que termina
Nenhuma pressa
Ano que começa

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Postagem azul



Na minha vasta ignorância literária, ainda estou criando minhas referências. Uma delas, já solidificada, é com um poeta local Carlos Pena Filho. Por sinal, nem é a primeira vez que eu falo dele por aqui, está no circuito dos poetas e em um episódio dos versos de quarta.
Era de palavras delicadas, gostosas, com sacadas muito bacanas, como o poema que ele fez para Olinda, representado mais lá embaixo.
Este ano é o cinquentenário da morte prematura deste poeta e para lembrar sua passagem o Centro Cultural Santander fez uma exposição sobre ele.

Pude conferir e está muito boa. Não lembro de uma mostra bem cuidada assim para um poeta local sem muita força nacional. A exposição é dividida em 3 partes. No térreo há uma overdose de poemas dele e dois setores caracterizados. Um representando o bar Savoy (bar mítico que reunia os intelectuais no século passado), passando para um ambiente completamente azul (reflexo do desmantelo azul, um dos sonetos mais famosos dele), inclusive tendo um audio do próprio Pena Filho recitando o poema. No primeiro andar, um curta sobre o autor e no segundo algumas fotografias, vídeos e outras exposições artísticas que se vinculavam a poemas dele. No estilo do meu álbum do meu quintanando .
Sendo bem feito, de um poeta que eu realmente gosto, foram momentos valiosos que eu passei por lá. Ainda devo voltar para rever tudo de novo, mais azulado :D

Alguns poemas embaixo sobre coisas que citei aí em cima

(1) Trecho: Chopp (Copiei daqui)
Na avenida Guararapes,
o Recife vai marchando.
O bairro de Santo Antonio,
tanto se foi transformando
que, agora, às cinco da tarde,
mais se assemelha a um festim,
nas mesas do Bar Savoy,
o refrão tem sido assim:
São trinta copos de chopp,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados.

(2) Trecho: Olinda (tirei daqui)
Olinda é só para os olhos,
Não se apalpa, é só desejo.
Ninguém diz: é lá que eu moro
Diz somente: é lá que eu vejo.

(3) Desmantelo azul (tirei daqui)
Então pintei de azul os meus sapatos
Por não poder de azul pintar as ruas
Depois vesti meus gestos insensatos
E colori as minhas mãos e as tuas

Para extinguir de nós o azul ausente
E aprisionar o azul nas coisas gratas
Enfim, nós derramamos simplesmente
Azul sobre os vestidos e as gravatas

E afogados em nós nem nos lembramos
Que no excesso que havia em nosso espaço
Pudesse haver de azul também cansaço

E perdidos no azul nos contemplamos
E vimos que entre nascia um sul
Vertiginosamente azul: azul.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Diálogo real

Há pessoas que chegam ao seu lado e te tratam como se fosse um amigo íntimo. Não sei até que ponto era verdade isso abaixo (ou se tinha o mínimo de verdade), mas foi assim que aconteceu: o diálogo esquizofrênico abaixo foram intercalados por momentos silenciosos.

Diálogo um: Abrindo o coração para um pobre sem crédito

Via uma exposição de fotografia enquanto uma senhora chegou:
- Você está gostando da exposição?
- Sim, eu gosto muito de fotografia. Estão muito boas estas.
- São realmente bonitas
- Se eu soubesse eu avisaria a uma amiga minha que gosta desta área, pena que não deu.
- Ah, chame ela então. A exposição só vai até hoje.
- Não dá tempo. Ela tem outras coisas hoje.
- Se quiser eu empresto o celular
- Mas não é questão de telefonar, senhora...

[Me olhei de parte a parte pra saber quão maltrapilho eu estava]

Diálogo 2: Perseguição
- Você não sabe como é difícil ser namorada de um deputado
- Oi?
- É. Difícil ser namorada de um deputado.
- Mas por que, exatamente?
- É muito difícil. Tem que ficar atento ao pessoal que quer atrapalhar a vida. São piores do que os paparazzi. Deixei de ir pra um show por conta disso.
- É né. Complicada esta vida pública
- Eles me perseguem. Olhe que eu nem tenho mais nada com o deputado, mas tão sempre querendo pescar alguma coisa
- Tem que ficar sempre atento né?

[Receei posar de amante dela na capa da contigo]

Diálogo 3: Conselho ao pobre
- Ele é apaixonado por mim, mas eu não quero nada com ele
- Oi?
- O deputado. Não vale a pena não. Vou te dar um conselho rapaz.
- Sim, pode dizer
- Nunca se case com uma vereadora. É só pra dar dor de cabeça
[Ela deputado, eu vereadora. Mas eu concordo, nunca namorei uma vereadora legal]

[Diálogo 4: Revelações e autoenganações]
- O deputado me pediu em casamento, mas eu não quis.
- Ué, não achava um boa?
- Ah, ele é bonito, rico, me ama. Mas quero não. Ele que volte pra aquelas duas amantes dele
- Oi?
- É, fulana e sicrana o nome das duas. Ele se quiser, que fique com elas. Felizmente eu nunca precisei de ninguém pra me sustentar.
- Então é melhor mesmo né, vai ser só dor de cabeça
- Mas eu sei que ele me ama.

[Ama, ama sim. Tenho certeza]

[Final: análise artísticas apuradas]
- Tem uma obra belíssima na outra sala, fica no lado direito entre dois quadros
- Eu chego lá já. Mas não é uma exposição de quadros esta próxima?
- É. Mas tem outra peça lá
- Tá bem, eu chego lá já.
- Eu vou aqui dar uma olhada.
Instantes depois eu vou em direção a esta sala, encontro a senhora na porta, como quem estivesse saindo.
- Eh.. eu acho que me confundi
- Foi? O que houve
- É que não era bem um quadro.

Entro na sala, olho pra direita, conforme a indicação da mulher. Na minha primeira impressão, havia algo no branco espaço entre dois quadros, com a plaquinha explicativa embaixo da obra. Não era um quadro e muito menos uma obra de arte. Era uma tremenda infiltração na parede, que vinha desde o teto e pipocara bem no lugar onde esteve um quadro, que obviamente fora retirado. Só que deixaram a plaquinha lá onde estava.

Pena que minha bateria da câmera nao cooperou. A infiltração eu iria fotografar.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Impressões legais

Conversa preliminar com uma desconhecida até então na exposição, conversando sobre viagens:
Começo:
- O gasômetro fica lá perto do centro de cultura Mário Quintana, em Porto alegre
- É bacana lá?
- Ah, eu gostei daquelas bandas.
- Você tem cara de que gosta de poesia.

Eba
:D

domingo, 5 de dezembro de 2010

Humanscapes

Sempre achei que o sentido que davam aquele clichê "definir-se é limitar-se" pobre e preguiçoso. Creio que ninguém consegue ser definido em poucas palavras, mas é possível traçar alguns princípios mais "profundos" que nos norteiam. Princípios que podem ser ampliados, reduzidos ou modificados no curso da vida. Além disso, o ilimitado não existe. Como diria Wittgenstein, os meus limites são os da minha linguagem. Reconhecer a própria limitação é um ponto importante para buscar, caso queira, coisa além dos seus próprios limites.

A questão então se torna no posicionamento dos limites, na sua amplitude. Apelando para eufemismos, vou classificar dois exemplos abaixo: os definidos e os "pouco definidos"

Vamos considerar uma perspectiva externa de alguém "definido". Uma pessoa comum, de reações frequentemente previsíveis, com qualidades e defeitos marcantes que se faz questão de manter por questão de "coerência". Uma pessoa "bonita e do bem". Uma representação nas artes plásticas poderia ser uma pintura de traços clássicos.


A beleza deste quadro é evidente e de esforço baixo para a compreensão. Você consegue ver ver com precisão os contornos do corpo. Traços bem definidos. Há alguns pequenos defeitos escondidos aí, defeitos que dependem do olhar de quem vê e da qualidade do pintor.

E os menos definidos? Alguém que você enxergue como um esboço, já que as ações não seguem necessariamente um padrão (ou ao menos parcialmente). Poderia ser algo assim


Isso é a Marilyn? Não sei, mas parece. Pode ser aquela cena clássica dela tentando segurar a saia sobre a saída de vento. A expressão facial é quase invisível. Uns traços pretos são o esboço das mãos e o que parece ser as pernas é uma composição preta e amarela. Não se sabe direito o que é cabeça, pescoço, vestido, braço e paisagem, são só impressões e comparações com uma referências que temos em mente.

Temos algumas referências para enxergar este último quadro, mas não certezas. O que fica dele não é são os contornos óbvios evidentes a nossa face, mas as impressões que ele passa dentro desta perspectiva. Esta é uma qualidade (?!) das pessoas pouco-definidas. Estes borrões de incerteza dão uma margem muito bacana para poder navegar, encontrar surpresas e outras perspectivas. Os idiotas da objetividade vão ver apenas um borrão, afinal, é melhor depreciar o que exige mais esforço.

Juro que eu prefiro esse "borrão" do quadro de baixo.

* Este quadro embaixo que motivou esta discussão está em exposição no centro cultural dos correios. Mas se não quiser ir lá ver, pode ver este e outros quadros aqui no site do pintor

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Versos de Quarta - Frei caneca

Estive na expoideias no domingo. Não sou muito chegado neste tipo de feira, mas resolvi dar uma espiada. Das poucas bancas que me prenderam, uma era a da Cepe, uma editora pernambucana. Havia uma coletânea de escritores pernambucanos. e vejo um poema muito legal
Segue um trecho:

Não posso contar meus males,
Nem a mim mesmo em segredo;
É tão cruel o meu fado,
Que até de mim tenho medo.

Dos homens sendo a paixão
Incêndio voraz no peito,
Sempre tem funesto efeito,
Se não rebenta o vulcão.
Eis porque, meu coração,
Pouco falta, que me estales;
Porque nos montes, nos vales,
Em deserto, ou povoado,
Não posso soltar um brado,
Não posso contar meus males.

(...)

O peito d’antes sereno
Centro de amor e ternura,
Agora é morada escura
De males mil, com que peno.
Vós p’ra quem um fado ameno
Aponta com áureo dedo,
Fugi de mim porque cedo
Mudar-se vereis a sorte;
Pois o meu mal é tão forte,
Que até de mim tenho medo.

Inteira e com a grafia antiga aqui

Aí, observo de quem era e me surpreeendo, era do Frei Caneca. Ele foi um do líderes da Confederação do Equador, movimento separatista pernambucano em 1824. Eu sabia que ele era intelectual, professor, e um dos redatores do jornal revolucionário . Mas na minha vasta ignorância, não sabia que ele tinha registrado boas poesias. Libertário, forte, a poesia parece refletir um pouco o espírito do revolucionário.

Um Frei que escreve sobre uma paixão forte (dizem que os primeiros 4 versos foi para uma mulher, de amor impossível) e que reconhece o próprio mal nos últimos versos?
Me tornei mais fã dele ainda!